28/8 – Dia Nacional de Combate e Prevenção ao Escalpelamento
O vai e vem rotineiro das embarcações pelos rios da Amazônia, carrega uma luta de décadas contra um dos acontecimentos mais violentos e trágicos da região: o escalpelamento. Poucos segundos bastam para uma vida ser tomada por sequelas físicas e danos psicológicos.
Estudos feitos pela Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisas (Fapespa) constataram que apenas três Estados registram escalpelamento: Pará, Amapá e Amazonas. Peculiaridades da região contribuem para o surgimento de casos. A Região Amazônica tem a extensão de 8 milhões de km², com a maior bacia hidrográfica do planeta. Nesse contexto, percorrer áreas de grandes ou pequenas extensões de rios, igarapés e furos, requer o uso de embarcações. Para ribeirinhos, grupo reconhecido como povos tradicionais que mora às margens dos rios da Amazônia, o processo é habitual, sendo pelas águas, muitas vezes, o único caminho possível para conseguir realizar deslocamentos cotidianos.
No ano de 2010, a Lei nº 12199 instituiu 28 de agosto como o Dia Nacional de Combate e Prevenção ao Escalpelamento, com o objetivo de conscientizar os brasileiros sobre esse grave problema e dar visibilidade à situação de exclusão que as vítimas enfrentam. É necessário fortalecer a prevenção desse tipo de acidente e garantir os direitos das vítimas, especialmente no que se refere à educação e à proteção social.
Escalpelamento é o arrancamento brusco do escalpo, o couro cabeludo. Quando cabelos compridos se enrolam, por exemplo, nos eixos e partes móveis dos motores de barcos, esse grave acidente pode ocorrer, arrancando parte ou todo o couro cabeludo, e até pálpebras, orelhas e face.
Esse tipo de desastre ocorre em embarcações precárias, onde não existe nenhum dispositivo de proteção do eixo dos motores e das hélices. Desta forma, quando o motor é ligado, o eixo gira em alta velocidade. Se o indivíduo se aproxima sem a devida proteção, cordas, cordões, lenços ou cabelos podem rapidamente se enroscar no eixo, causando o acidente.
As consequências do escalpelamento podem variar dependendo da área do corpo afetada. Em muitos casos as lesões provocam sequelas físicas e emocionais severas, podendo levar até mesmo à morte. Vários pacientes relatam dores crônicas de cabeça ou no pescoço, dificuldades na audição, na fala e na visão.
Essas disfunções comprometem a qualidade de vida, o lazer e o emprego das vítimas, que muitas vezes ficam impossibilitadas de trabalhar.
As consequências complexas do acidente exigem tratamento especializado, de longa duração, em hospitais com equipe multidisciplinar e de alto nível de complexidade.
O tratamento hospitalar, ainda que necessário, é um processo longo, doloroso, difícil e inesperado, que impõe alterações em diversos aspectos da vida do paciente e de sua família. Desde mudanças físicas, que estigmatizam a alterações abruptas de ambiente, convivência e costumes, além de submissão a procedimentos desconhecidos, que geram medo, dúvidas, angústias, falta de colaboração e até aversão e recusa, contribuindo negativamente com a evolução da terapia.
O longo processo para tratar pacientes de escalpelamento consiste em cirurgia plástica reparadora e implante capilar, bem como acompanhamento psicológico.
Prevenção e controle:
A Lei 11970/2009 determina em seu art. 4º: “Sem prejuízo das normas adicionais expedidas pela autoridade marítima, é obrigatório o uso de proteção no motor, eixo e quaisquer outras partes móveis das embarcações que possam promover riscos à integridade física dos passageiros e da tripulação. ”
Segundo dados da Capitania dos Portos da Amazônia Oriental (CPAOR), 93% dos casos de escalpelamento da região amazônica têm mulheres como vítimas. Destas, 65% são crianças, 30% adultos e 5% idosos. Ainda, de acordo com a CPAOR, entre os anos de 2006 e 2023, ocorreram 180 casos desse tipo de acidente na região.
A Marinha do Brasil, por meio das capitanias de portos, instala gratuitamente a cobertura de eixo do motor e, no período de 2009 a 2023, foram instalados 5500 equipamentos de proteção.
De acordo com a Capitania, somente o Pará registrou a existência de 21.232 embarcações, dentre as quais 6.163 seriam somente para o transporte de passageiros. Todavia, estima-se que aproximadamente 40 mil embarcações naveguem em condições clandestinas.
Recomendações aos usuários de embarcações:
– Nunca armar rede ou sentar com os cabelos soltos perto do motor;
– Prender os cabelos e cobri-los com um boné ou chapéu;
– Evitar usar lenços, colares ou cordões;
– Manter as crianças sempre junto do responsável.
Aos condutores e ou proprietários de embarcações, a recomendação é manter a segurança dos passageiros com a instalação e o uso da cobertura de eixo do motor, conforme determina a legislação.
Fontes:
Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho
Capitania dos Portos da Região Amazônica Oriental
Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisas (Fapespa)
Ministério Público do Trabalho – 11ª Região
Núcleo de Telessaúde de São Paulo
Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica
Sociedade de Pediatria de São Paulo